Transferência de Local de Trabalho: O Prejuízo Sério

Doc_PDF

O Código do Trabalho consagra a regra segundo a qual o empregador não pode transferir o trabalhador para outro local de trabalho, sendo este um dos elementos fundamentais da relação laboral.

Em princípio, o trabalhador deve exercer a sua actividade no local contratualmente definido.

O princípio geral da inamovibilidade traduziu-se, assim, na proibição do empregador transferir, livremente, o trabalhador de local de trabalho.

Deste modo, a lei consagrou a proibição de transferência de local de trabalho como uma das principais garantias do trabalhador.

Contudo, não seria comportável que, essa regra, não contivesse excepções, motivadas por factores, essencialmente, de índole empresarial e económica.

 

O trabalhador pode ser transferido para outro local de trabalho nas seguintes situações:

a)      por acordo entre as partes;

b)      por previsão expressa em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho;

c)      nos casos previstos no Código do Trabalho.

 

Nos termos do disposto no art. 194º nº1 do Código do Trabalho, o empregador pode transferir o trabalhador para outro local de trabalho, temporária ou definitivamente, quando o interesse da empresa o exija, desde que a transferência não lhe cause prejuízo sério.

Por sua vez, o nº 5 do art. 194º estabelece que, no caso de transferência definitiva, o trabalhador pode resolver o contrato se tiver prejuízo sério, tendo direito à indemnização prevista no art. 366º do C.T.

 

Torna-se, então, necessário reflectir sobre a concretização do conceito de prejuízo sério.

O conceito supra mencionado é fundamental para efeitos de limitação do poder do empregador de alterar o local de trabalho do trabalhador e do direito à resolução, e respectiva compensação, por parte do trabalhador.

 

Na concretização do conceito de prejuízo sério tem sido defendido pela jurisprudência que o mesmo deve ser apreciado segundo as circunstâncias concretas de cada caso, devendo assumir um peso significativo na vida do trabalhador, não podendo consistir num mero incómodo ou num transtorno suportável.

A maioria da doutrina e da jurisprudência considera que “meros incómodos” ou “transtornos suportáveis” que possam ser causados ao trabalhador não devem ser considerados para efeitos de concretização do conceito de prejuízo sério.

Contudo, os próprios conceitos de “meros incómodos” ou “transtornos suportáveis” também são indeterminados, pelo que a sua determinação tem sido feita casuisticamente pelos tribunais.

 

Para melhor entendermos o conceito de prejuízo sério, podemos atentar no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Março de 1999.

No referido Acórdão, está em causa a transferência de um trabalhador de Santarém para Alverca do Ribatejo.

O trabalhador considerou que aquela transferência lhe causou um prejuízo sério e para demonstrar o referido prejuízo, o trabalhador alegou que a distância que passou a percorrer na deslocação para o novo local de trabalho implicou um acréscimo de cerca de 100km a 150 km. Alegou, ainda, que a maior distância que teve de passar a percorrer lhe acarretou uma maior dificuldade em visitar o seu pai que padecia de doença crónica.

O Tribunal entendeu que os factos alegados pelo trabalhador não configuravam um prejuízo sério, mas apenas um simples transtorno.

 

A distância percorrida e o tempo de deslocação para o novo local de trabalho são os critérios mais utilizados para a determinação do conceito de prejuízo sério.

O Supremo Tribunal de Justiça tem entendido que o gasto de 2 horas em deslocações para o novo local de trabalho, no contexto da vida urbana actual, é um mero incómodo que afecta a maioria dos trabalhadores nos grandes cidades.

Admitimos a importância que este critério tem na concretização do prejuízo sério, mas consideramos que este não poderá ser o único.

No caso subjacente ao Acórdão supra referido, sobrevaloriza-se o critério da distância em detrimento da perturbação causada ao trabalhador pelo facto de este não poder visitar o pai que padecia de doença crónica.

 

Em sentido diverso, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 5 de Maio de 1993, o qual entendeu-se que se se provar que a transferência determinou uma alteração substancial do plano da vida do trabalhador, traduzida na redução da possibilidade de poder prestar a mesma assistência aos dois filhos menores e na diminuição do tempo de convívio com os mesmos, está provada a existência de prejuízo sério.

Todavia, esta não tem sido a orientação da generalidade da jurisprudência.

Os tribunais apenas têm admitido a existência de prejuízo sério em situações em que está em causa a necessidade de mudança de residência ou o acréscimo de, pelo menos, 200 km de distância na deslocação diária para o novo local de trabalho.

 

Dra. Carolina Santos Rolo

Advogada