A nova lei do Divórcio – Breve abordagem

A nova lei do Divórcio – Breve abordagem

 

Desde sempre a convivência do ser Humano em sociedade gerou a criação de laços entre si, que foram evoluindo ao longo dos tempos. Inicialmente com características marcadamente distintas, foram ganhando um sentido e uma dimensão diferentes. O casamento é de tal forma primordial que surge antes mesmo da criação do Estado.

Hoje em dia e tendo em conta o tipo de sociedade de globalização em que as relações humanas se tornam cada vez mais fugazes, em que tudo é vivido muito intensamente mas ao mesmo tempo é muito frágil, importa perceber os vínculos jurídicos que se geram, mas é igualmente importante perceber a forma de cessar esses mesmos vínculos.

 

O Direito à Constituição da Família é de tal forma importante que ganhou contornos de direito fundamental estando por isso presente no nº1 do art. 36º da Constituição da República Portuguesa e desta forma a Lei e o ordenamento jurídico estabelecem o casamento como o “contrato celebrado entre duas pessoas que pretendem constituir família mediante plena comunhão de vida”. Isto é, o casamento tem característica sacramental ou laica, possui um carácter contratual, surge da autonomia privada, o Estado é chamado a intervir na regulamentação da celebração do acto, gerando-se o casamento como uma instituição.

 

Com o evoluir dos tempos, foi no entanto necessário criar uma figura que se entende estar a meio caminho para o casamento, a União de Facto. Define o ordenamento jurídico como uma situação da vida real em que duas pessoas vivem em condições análogas à dos cônjuges, sem haver no entanto entre si qualquer vínculo matrimonial, sendo assim fonte de relações parafamiliares.

 

Tal como se disse, importa saber a modalidade dos vínculos entre as pessoas, mas muito importante é também saber a forma de os cessar. Para tal, surge o instituto do Divórcio, presente no art. 1788º CC.

 

O regime do Divórcio sofreu algumas alterações de fundo aquando da Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro. Esta Lei veio mudar a perspectiva de abordagem do próprio divórcio, eliminando a figura da Culpa Conjugal, como fundamento da dissolução do casamento. Desta forma o divórcio pode assumir agora duas formas, o divórcio por mútuo consentimento ou o divórcio sem consentimento de um cônjuge, abandonando-se assim o divórcio litigioso.

Vamos perceber de forma mais profunda, cada uma destas modalidades, vincando as diferenças em relação ao regime de até então.

 

A modalidade de divórcio por mútuo consentimento presente nos art. 1773º a 1780º do Código Civil, caracteriza-se essencialmente por ser requerido por ambos os cônjuges, a todo o tempo, na conservatória do registo civil, através de um requerimento assinado por ambos os cônjuges. Para que haja divórcio, os cônjuges têm no entanto de estar de acordo relativamente a três aspectos das suas vidas, isto é, só é possível este tipo de divórcio, se conseguirem acordar quanto ao exercício das responsabilidades parentais, que cabem agora sempre a ambos os cônjuges, quando existirem filhos menores, quanto à prestação de alimentos ao cônjuge que deles necessite e por último quanto à casa de morada de família. Estando de acordo quanto a estes três pontos que se entendem ser os fundamentais para que o divórcio se possa fazer nestes moldes, este será decretado na Conservatória do Registo Civil, sem mais delongas, sem antes porém ser tentada a reconciliação e informando os mesmos da possibilidade dos serviços de mediação familiar. Se for entendido pelo conservador que estão preenchidos todos os requisitos, e que os acordos estão conformes com a Lei e com os interesses de ambas as partes, o mesmo é decretado, tendo esta decisão os mesmos efeitos das Sentenças Judiciais.

No caso de um divórcio por mútuo consentimento, em que existam filhos menores, e seja necessário acautelar o exercício das responsabilidades parentais, o acordo apresentado, é enviado para o Ministério Público, junto do Tribunal Judicial de 1ª Instância competente, que se deverá pronunciar em 30 dias. Se os acordos apresentados, não acautelarem devidamente os interesses tanto dos cônjuges, como dos filhos menores, o processo é remetido para o Tribunal da Comarca a que pertence a conservatória, correndo desta forma o processo e sendo decidido nesta sede.

 

A outra modalidade é o Divórcio sem consentimento de um dos cônjuges. Este é requerido no Tribunal, existe sempre tentativa de conciliação, se a mesma não for bem sucedida, existirá a tentativa do Juiz para obter acordo para que o processo decorra sob a modalidade de Divórcio por mútuo consentimento.

De acordo com o art. 1782º CC, são fundamentos para a ruptura do casamento, a separação de facto por um ano consecutivo, a alteração das faculdades mentais do outro cônjuge, quando dure há mais de um ano, e que pela sua gravidade, comprometa a possibilidade da vida em comum, a ausência sem que do ausente haja notícias por tempo não inferior a um ano e por último, quaisquer outros factos que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem a ruptura efectiva do casamento. Existe portanto, o desaparecimento da figura da violação culposa dos deveres conjugais e um encurtar do tempo de separação de facto, necessário para que este tipo de dissolução de casamento seja possível. Houve uma manifesta intenção de facilitar a concessão do divórcio. Desta forma, basta que qualquer facto mostre a ruptura definitiva do casamento, independentemente da culpa dos cônjuges e pode o divórcio ser requerido por qualquer um deles. Altera-se ainda o facto de a acção de divórcio poder ser intentada a qualquer momento, uma vez que até à alteração legislativa, o cônjuge ofendido que tivesse conhecimento do facto susceptível de fundamentar o pedido, tinha dois anos para pedir o divórcio baseado nisso, tal como preceitua o art. 1786º CC.

Ora o divórcio dissolve o casamento e tem os mesmos efeitos da dissolução por morte, produzindo efeitos a partir do trânsito em julgado da sentença. No entanto relativamente aos efeitos patrimoniais, os efeitos da sentença iniciam-se desde a data da propositura da acção.

No que diz respeito à partilha de bens, nenhum dos cônjuges pode receber mais do que receberia se o casamento tivesse sido contraído de acordo com o regime da comunhão de adquiridos. Ou seja o cônjuge perde os benefícios recebidos ou que tiver para receber do outro cônjuge ou de terceiro.

 

A modificação essencial que se encontra com esta nova Lei é sem dúvida o desaparecimento da discussão da violação culposa dos deveres conjugais do processo do Divórcio, bem como a consagração de um crédito compensatório ao cônjuge que contribuiu de forma consideravelmente superior para os encargos da vida familiar.

Pode concluir-se assim, que houve uma tentativa de simplificar o processo, gerada pelo aumento exponencial de divórcios no nosso pais.

 

 

Dra. Ana Eduarda Gonçalves, Advogada-Estagiária (com o acompanhamento da Dra. Bárbara Silva Soares, Advogada)

 

 

Agradecemos que os interessados em esclarecimento de dúvidas ou questões jurídicas, as remetam para braga@csadvogados.pt. Após análise, algumas serão seleccionadas para resposta na Revista SIM.

 

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